Ingestão diária de mercúrio excede os limites seguros em seis estados da Amazônia 

Moradores de, pelo menos, 17 cidades de seis estados da Região Norte, entre as quais Manaus (AM), Humaitá (AM) e Porto Velho (RO), estão consumindo peixes contaminados por mercúrio acima dos níveis considerados seguros pela Organização Mundial de Saúde (OMS). A informação é de um estudo que mostrou que, em média, 21,3% dos peixes comercializados nos principais centros urbanos da Amazônia têm níveis de mercúrio acima dos limites seguros.  Entre março de 2021 a setembro de 2022, profissionais envolvidos no levantamento compraram 1.010 peixes de 80 espécies em mercados e feiras livres em cidades do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima, com o objetivo de reproduzir a experiência de compra dos moradores locais. As amostras foram coletadas em: Altamira (PA), Belém (PA), Boa Vista (RR), Humaitá (AM), Itaituba (PA), Macapá (AP), Manaus (AM), Maraã (AM), Oiapoque (AP), Oriximiná (PA), Porto Velho (RO), Rio Branco (AC), Santa Isabel do Rio Negro (AM), Santarém (PA), São Félix do Xingu (PA), São Gabriel da Cachoeira (AM) e Tefé (AM).  Os resultados mostram que peixes apresentaram níveis de contaminação acima do limite aceitável de ≥ 0,5 µg/g, estabelecidos pela OMS.  Os piores índices estão em Roraima, com 40% de peixes com mercúrio acima do limite recomendado, e Acre, com 35,9%. Já os menores indicadores estão no Pará, com 15,8%, e no Amapá, com 11,4%.  Em todas as camadas populacionais analisadas, a ingestão diária de mercúrio excedeu a dose de referência recomendada. No município mais crítico, de Rio Branco (AC), a potencial ingestão de mercúrio ultrapassou de 6,9 a 31,5 vezes a dose de referência indicada pela Agência de Proteção Ambiental (EPA) do governo norte-americano, que é 0,1 μg/kg pc/dia.  As mulheres em idade fértil - público mais vulnerável aos efeitos do mercúrio - estariam ingerindo até 9 vezes mais mercúrio do que a dose preconizada, enquanto crianças de 2 a 4 anos até 31 vezes mais do que o aconselhado.  As análises foram realizadas no Centro de Tecnologia Mineral (CETEM/RJ) e no Instituto Evandro Chagas (IEC/PA). O estudo foi realizado por um grupo de instituições que inclui a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o WWF-Brasil, o Instituto Socioambiental (ISA), o Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé), a Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) e o Greenpeace Brasil. Leia a análise completa.  Texto adaptado do original publicado no site da WWF – Brasil. Leia na íntegra. https://www.wwf.org.br/?85940/Novo-estudo-mostra-que-ingestao-diaria-de-mercurio-excede-os-limites-seguros--em-seis-estados-da-Amazonia 

Indígenas discutem novo protocolo para denúncia de crimes ambientais 

Lideranças indígenas e representantes do governo se reuniram para discutir novos protocolos e ferramentas de denúncias durante o seminário Combatendo atividades ilegais em Terras Indígenas, realizado entre os dias 16 e 18 de maio, em Manaus (AM).  O evento teve o objetivo aumentar a atuação dos órgãos de controle e fiscalização do Amazonas e conter o avanço dos crimes ambientais em terras indígenas. Participaram do encontro representantes das frentes de monitoramento territorial das Terras Indígenas Coatá-Laranjal, Setemã, Cunhã-Sapucaia, Tenharim Marmelos, Lago Jauari, Camaiuá e Pinatuba, além de indígenas de outras regiões do Brasil e servidores de órgãos dos governos federal e estadual.  O seminário é fruto da cooperação entre o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e a WCS Brasil, por meio da iniciativa Conservando Juntos, com apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).  A incidência de crimes como invasão de terras e pesca ilegal coloca em risco o bem-estar e a qualidade de vida das comunidades indígenas. Sem um programa de fiscalização adequado, a sobreposição de atividades ilícitas nesses territórios aumenta a pressão e ameaça a segurança desses territórios.  “Esse é um projeto que nasce com o intuito de propor ações que vão coibir, combater e reduzir os crimes ambientais nas áreas protegidas. Mas, para isso acontecer, temos que dialogar com os órgãos públicos, federais e estaduais, que têm como competência aplicar a lei, e uni-los com as organizações indígenas que estão empregando ações diretas de monitoramento em seus territórios”, afirma Martha Fellows, pesquisadora no núcleo indígena do IPAM.  Vanessa Apurinã, gerente de monitoramento territorial da Coiab, aponta a importância de associar o monitoramento conduzido tradicionalmente às ferramentas tecnológicas. “Quando o parente vai caçar, pescar, vai para a sua roça, isso é monitoramento, porque pode relatar que viu roçado, que viu rastros diferentes. Estamos apenas adaptando esse processo à tecnologia”, completa. A organização planeja realizar mapeamento de ameaças, pressões, além de formar grupos para essas atividades nos territórios.  Texto adaptado da publicação original no site do IPAM escrito pelo jornalista Lucas Guaraldo. Leia a publicação na íntegra clicando aqui. 

Draga de garimpo invade Áreas Protegidas em Tapauá e revolta população 

Uma draga de garimpo invadiu, pelo menos, cinco Áreas Protegidas em Tapauá, no sul do Amazonas, entre os dias 28 de abril e 24 de maio. A presença da embarcação revoltou moradores do município, que tomaram as ruas em protesto cobrando ações enérgicas do poder público. A maior preocupação das pessoas era a iminente contaminação de peixes e da água consumidos na região. A autuação da prefeitura não intimidou os operadores da embarcação, que ainda percorreu quilômetros no rio Purus entre a Floresta Estadual (FES) Tapauá, Terra Indígena (TI) Apurinã do Igarapé do São João, a Reserva Biológica (Rebio) do Abufari, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Piagaçu-Purus e a TI Itixi-Mitari.  De acordo com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Turismo (Semmatur) de Tapauá, as denúncias sobre a presença da draga começaram em 28 de abril, quando ela estava nas proximidades das comunidades ribeirinhas Jatuarana e Itatuba. Com o apoio das polícias militar e civil, a secretaria começou as buscas pela draga, que foi encontrada perto da comunidade Baturité, na FES Tapauá onde foi lavrado o Auto de Notificação 004/2023-Semmatur devido a irregularidades como a ausência de Certidão de Viabilidade Ambiental (CVA), Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) Municipal e de um técnico responsável pela atividade. A medida interrompeu momentaneamente a atividade da embarcação.  A draga tinha Licença de Operação (LO) do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) com data de emissão em 17 de fevereiro de 2023, em nome de João Leonardo Leismann De Sá Chaves, empresário de Rondônia ligado à Cooperativa dos Trabalhadores em Garimpo, Extrativismo, Pesca e Ambientalismo do Estado e à Nacional Intermediações LTDA. A LO autorizava a draga à pesquisa mineral de ouro em 421 hectares no período de um ano. A embarcação também tinha uma placa com número de alvará da Agência Nacional de Mineração (ANM).  Draga Dubai circulou por Áreas Protegidas de Tapauá. Fotos: Semmatur/Divulgação e Ibama/Divulgação No dia 29, a embarcação parou no Igarapé São João, na aldeia de mesmo nome, na TI Apurinã do Igarapé do São João, próximo ao porto da cidade. Ela ficou no local em suposta manutenção até o dia 8 de maio, quando voltou para a comunidade Baturité.  Em 3 maio, a prefeitura acionou por de ofício o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).  Sem resposta concreta do Ibama, no dia 10, a Semmatur deflagrou a Operação Dubai, em alusão ao nome da draga. Na ocasião foram realizados autuações e embargos com base no Código Ambiental do Município de Tapauá, pois as irregularidades constatadas na primeira fiscalização não foram sanadas, o que justificou a suspensão das atividades e a condução dos garimpeiros ao 64º DIP de Tapauá, onde prestaram esclarecimentos e assinaram um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) e foram liberados em seguida. A prefeitura pediu que a draga fosse retirada do município, que desceu o rio.  Quando foi destruída, no dia 24 de maio, a balsa estava na Boca do Lago Itaboca, entre as comunidades Beabá e Itaboca, dentro da RDS Piagaçu-Purus e no entorno da TI Itixi-Mitari, já nos limites do município de Beruri. O Observatório BR-319 apurou que não há no sistema de dados da ANM registro de autorização de pesquisa ou lavra garimpeira nesta área.  Segundo informações da superintendência do Ibama no Amazonas, uma Força-Tarefa de Segurança Pública Ambiental (FTSPA) destruiu a Draga Dubai durante a Operação Gana, em ação coordenada entre a Polícia Federal, Ibama, Polícia Militar e Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Amazonas (Sema-AM). A força-tarefa se deslocou de hidroavião de Manaus, por cerca de 1h30, até a sede do município de Tapauá, de onde partiram de lancha em busca da draga, que foi localizada após, aproximadamente, 15 horas de buscas.  “A draga estava escondida na RDS Piagaçu-Purus. Após abordagem pela FTSPA, foi constatada a mineração ilegal. Foi realizada a destruição da embarcação conforme os normativos vigentes, por não haver possibilidade de sua remoção, além da balsa de combustível, do empurrador e de 6 mil litros de diesel. Foram aplicadas multas que totalizaram aproximadamente R$ 16, 5 milhões”, informou a superintendência do Ibama no Amazonas. Além disso fora lavrados três Autos de Infração, três Termos de Apreensão, três Termos de Destruição e um Termo de Doação. A região por onde a balsa transitou é uma das mais preservadas da área de influência da BR-319. O Observatório BR-319 apurou que a embarcação esteve na Rebio Abufari, que é uma Unidade de Conservação (UC) de proteção integral e de acesso restrito, onde a visitação pública é proibida, exceto com objetivos educacionais. No caso da RDS Piagaçu-Purus, existem lagos onde peixes-bois são soltos para reabilitação na natureza. De acordo com a Sema-AM, a área de soltura dos animais fica na comunidade Cuiuanã, distante do local onde a draga foi destruída.  “Nosso posicionamento é totalmente contrário ao garimpo em nosso município! Nossas ações, dentro das nossas atribuições legais, foram imediatas e contundentes! Fizemos as atividades paralisar e retiramos a embarcação da área. Todavia, como nosso perímetro municipal é imenso, a balsa ainda ficou, mais ou menos, 14 dias ancorada nas margens do rio Purus, próximo a comunidade Beabá, dentro de uma RDS Piagaçu-Purus, e ao lado de uma terra indígena”, relatou o secretário titular da Semmatur, Jaciel Santos. “Para o futuro, estamos trabalhando em legislação municipal que proíba toda qualquer atividade de mineração em Tapauá”, revelou.  O OBR-319 apurou, também, que não há justificativa para a presença de uma draga de grande porte para a realização da pesquisa mineral e não consta nos processos em tramitação na ANM a Guia de Utilização, que autorizaria a extração mineral já na etapa de pesquisa. A LO emitida pelo Ipaam menciona somente a “prospecção superficial”, que não necessitaria de uma draga de grande porte para ser realizada. Portanto, há a suspeita de que o Alvará de Pesquisa Mineral, emitido pela ANM, possa ser utilizado de forma ilícita para respaldar atividade de garimpo ilegal. Além dos órgãos ambientais federais, estaduais e municipal, o Ministério Público Federal (MPF) e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), também foram acionados.  O mapa mostra onde ficam a UCs, a sede do município de Tapauá e os locais onde a balsa foi vista e teve a localização geográfica informada à Semmatur e ao Ibama. O linha mais grossa em azul é o rio Purus, por onde a draga navegou A importância socioambiental do Médio Purus   Tapauá fica na calha do Médio Purus e é um dos maiores municípios do Amazonas, com 8.536.563 hectares, e 16.876 habitantes. A região abriga Áreas Protegidas importantes, como a Rebio Abufari, que tem um dos maiores tabuleiros de reprodução de quelônios da Amazônia. Além disso, tanto o povo Apurinã da TI Itixi-Mitari quanto as populações ribeirinhas da RDS Piagaçu-Purus realizam o manejo de pirarucu, uma das atividades econômicas mais sustentáveis da região, que gera renda aos envolvidos e, ainda, fortalece a conservação da espécie. A RDS, inclusive, é popular entre cientistas por ser um santuário para mamíferos aquáticos. A bióloga da WCS Brasil, Sannie Brum, conta que o local é um dos mais ricos em biodiversidade na Amazônia. Nascimento de quelônios na Rebio Abufari e soltura de peixe-boi realizada pela Ampa, na RDS Piagaçu-Purus, em 2021. Fotos: Camila Ferrara/WCS Brasil e Divulgação/Ampa “Para se ter uma ideia, o rio Purus é o local com maior densidade de botos já registrada na Amazônia e, em se tratando de pesca, a região tem muitas várzeas alagadas, tanto do Purus quanto do Solimões, o que gera muitas espécies de plantas macrófitas, importantes para a alimentação de peixes e mamíferos aquáticos, como botos e peixes-bois.", explica Sannie.  Desde 2016, a RDS Piagaçu-Purus tem sido a principal área de soltura de peixes-bois reabilitados em cativeiro pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Até 2021, 44 animais foram reintroduzidos na natureza na área de várzea da RDS, e monitorados via radiotelemetria com apoio das comunidades locais. Esta atividade tem sido uma estratégia importante de conservação da espécie, que é ameaçada de extinção.  “Um dos critérios de escolha de área de soltura é que o ambiente seja protegido, como dentro de Unidade de Conservação, mas, principalmente, que o habitat esteja saudável. Alguns estudos mostram que a poluição e a contaminação dos rios por conta de metais pesados provenientes do mercúrio usado nas atividades de mineração afeta, diretamente, o ambiente aquático e, consequentemente, a principal fonte de alimento da espécie, as plantas aquáticas e semiaquáticas”, explica Diogo de Souza, pesquisador da Associação Amigos do Peixe-Boi (Ampa). “O peixe-boi é uma espécie exclusivamente herbívora. Portanto, pode aumentar a probabilidade de mortalidade dos animais por conta da ingestão de alimento contaminado, ocasionando risco de intoxicação, lesão ou patologia tecidual”, acrescenta. Por que a mineração é ruim para a Amazônia? Para a extração de ouro de aluvião, os garimpeiros utilizam dragas de grande porte que revolvem o leito dos rios. A água é bombeada e filtrada com a utilização de carpetes, que retém os sedimentos. Os sedimentos são depositados em tanques de água e, neste momento, é utilizado o mercúrio para a amalgamação do ouro, ou seja, o minério se junta ao mercúrio formando pequenas pedras.  A última etapa é a queima destas pedras, quando o mercúrio é lançado à atmosfera, restando somente o ouro. A água com mercúrio que resta nos tanques, geralmente, é descartada nos rios, contaminando a fauna aquática e as pessoas que entram em contato com o metal.O parecer técnico Nº 1495/2019 do Ministério Público Federal (MPF) aponta que cerca de 80% das crianças nascidas em São Luiz do Tapajós, região no estado do Pará com alta incidência de extração de ouro, sofrem alterações no Quociente de Inteligência (QI) em virtude da contaminação por mercúrio oriundo do garimpo. O mercúrio também é responsável por diversos outros problemas de saúde, como doenças cardíacas, problemas de visão e paralisia cerebral. Leia mais sobre uma pesquisa inédita na seção Ciência.  População desrespeitada  No dia 18 de maio, moradores do município de Tapauá tomaram as ruas da cidade em protesto contra a presença da Draga Dubai. Com cartazes que diziam “não queremos garimpo em Tapauá. Nem legal e nem ilegal”, “a população indígena diz não ao garimpo” e “garimpo nunca foi a solução e sim a destruição”, pessoas de todas as idades fizeram uma manifestação pacífica que percorreu as ruas ganhando adesões.  Uma dessas pessoas foi José Pereira, do Movimento Juntos por Tapauá. Ele contou ao Observatório BR-319 que o posicionamento contra a mineração no município foi orgânico e mobilizou moradores da sede do município, de comunidades ribeirinhas e terras indígenas. “Pra gente foi uma surpresa saber da presença dessa balsa, dessa draga, no município de Tapauá, a gente nunca tinha visto uma embarcação desse porte no município de Tapauá e causou surpresa para todo o povo”, contou. “Sabendo de todos os males que extração de ouro e o garimpo provocam, nós não queremos, de maneira alguma, que a mineração se instale no nosso município! A gente sabe que as pessoas que dependem das águas para sobreviver vão ser muito afetadas e essa é uma ação que não tem volta”, relatou.  José disse que os muitos moradores ficaram revoltados ao saber que a draga tinha licenças do Ipaam e alvará da ANM para operar no rio Purus. População de Tapuá se revoltou contra a presença da draga no município. Foto: Robson Costa - Portal Purus Notícias/Reprodução “Sabemos que esse tipo de empreendimento só beneficia os grandes, e não as comunidades locais, por isso a gente foi para as ruas dizer que nós não queremos garimpo em Tapauá, que tem uma diversidade de povos indígenas presentes na beira do Purus e, ainda, muitas comunidades ribeirinhas”, disse Pereira. “A gente se moveu para dizer que nós não queremos, embora o Estado tenha dado essa liberação, embora a Agência Nacional de Mineração tenha dado esse alvará de funcionamento. Nós nos sentimos, acima de tudo, muitos desrespeitados, porque a gente sabe que para que essas licenças sejam emitidas, elas precisam ter a consulta prévia, principalmente dos povos tradicionais e dos povos originários como reza a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que diz que nenhum grande empreendimento que vai causar danos direto à população tradicional e à população indígena pode ser efetuada sem consulta prévia”, acrescentou. “O povo de Tapauá se sente desprotegido e desrespeitado por quem deveria nos proteger e nos respeitar”.  Outro morador de Tapauá que preferiu não se identificar disse temer pelo impacto no modo de vida da população local, que vive maioritariamente da pesca e da agricultura familiar, além da desestruturação social que o garimpo pode provocar. “As plantas sofrerão impacto de maneira direta, os peixes sofreram impacto de maneira direta, o povo sofrerá impacto de maneira direta. Pois bem, como que eu falo isso? Porque nenhuma mineração faz coleta de ouro sem mercúrio, ou seja, isso causa um impacto ambiental muito grande e o município de Tapauá só vive da pesca e da agricultura familiar em pequena escala. Qual é a pequena escala? É a agricultura familiar para sobreviver. E se nos tirarem o direito da população viver da pesca e da agricultura familiar, nós estamos tirando a vida dos ribeirinhos”, disse.  “Há um ditado que fala que, se você quiser acabar com um povo, acabe com a cultura dele! É nossa cultura viver da pesca, viver do peixe que nós pegamos, viver da mandioca que nós plantamos, do feijão que nós plantamos, da macaxeira que nós plantamos!”, finalizou.  Texto produzido em colaboração com o Coletivo Jovens Comunicadores do Sul do Amazonas (Jocsam) 

MPF alerta sobre pressões para exploração de potássio em território Mura em Autazes 

O procurador República Fernando Merloto Soave realizou uma coletiva de imprensa no dia 28 de abril para atualizações sobre o posicionamento do Ministério Público Federal a respeito da pressão pela exploração de potássio que ocorre na Terra Indígena (TI) Soares-Urucurituba, território do povo Mura, em Autazes (AM). O procurador defende que, antes de qualquer decisão ou processo, todos os territórios pendentes de reconhecimento formal no local sejam demarcados.  Desde 2014, os Mura têm denunciado ao MPF perfuração de poços sem autorização dos indígenas, até em cemitérios ancestrais, coação e pressão para a venda de terrenos, além de relatos de ameaças.  “Depois que a Funai nos fez uma visita, recentemente [em abril], surgiu muito disse-me-disse e eu recebi até ameaças, ‘porque a Funai ia demarcar e fazendeiros iriam perder terras’”, relatou o tuxaua Sérgio Mura, da Aldeia Soares. “Surgiram muitos boatos, muitas coisas mentirosas, porque ninguém tem o direito de tomar as terras de ninguém, todos são iguais perante a lei e a gente só quer o que está na Constituição, na lei 231”, esclareceu. “Já solicitamos a inclusão do tuxaua [Sérgio] no programa de direitos humanos por conta dessas ameaças”, acrescentou o procurador Fernando Merloto.  O tuxaua se refere a uma visita realizada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) para avaliação da criação de um grupo de trabalho para dar andamento ao processo de demarcação do território, medida indicada pela Justiça Federal. “O território indígena é um território independente de estar demarcado. A demarcação é um procedimento declaratório. É claro que traz mais segurança jurídica, mas é um processo declaratório. Não deixa de ser um território indígena pelo que o governo fala que é ou deixa de falar”, explicou Merloto. Entenda  O MPF no Amazonas passou a acompanhar o caso em 2014, depois de receber informações de que a empresa Potássio do Brasil começou a realizar estudos e procedimentos na região sem qualquer consulta às comunidades. Em julho de 2016, o órgão expediu recomendação ao Ipaam, para que cancelasse a licença já expedida, e à Potássio do Brasil, para que suspendesse as atividades de pesquisa na região até a realização das consultas nos moldes previstos na legislação. Nenhum dos pedidos foi atendido.   Não deixe de ler: Desembargador autoriza licenças para exploração de potássio em Autazes  Baixe documentos disponibilizados pelo MPF  Relatório antropológico Relatório de inspeção judicial Relatório de inspeção anexo I Relatório de inspeção anexo II - Entrevista com indígena

Informativo nº43 Maio/2023

Baixar O mês de maio de 2023 ficará marcado na história do Brasil como um período de retrocessos socioambientais, que prometem ser ainda maiores em breve. Com a mesma intensidade que o novo governo Lula nos trouxe esperança de dias melhores, nos impôs a certeza de um futuro sombrio com o desmonte do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e do Ministério dos Povos Indígenas, além do avanço do infame marco temporal, uma excrescência política e moral. O que mais entristece é que essas medidas não encontraram absolutamente nenhuma dificuldade para progredir no Congresso Nacional. É lamentável, desalentador e decepcionante.  No Destaque do Mês trazemos a cronologia de fatos importantes sobre a presença de uma draga de garimpo que invadiu Tapauá no final de abril e percorreu todas as áreas que quis durante o mês de maio, até que os órgãos ambientais conseguissem se mobilizar para localizá-la e, por fim, destruí-la. É impressionante, mas não inacreditável, a segurança de pessoas envolvidas em atividades de mineração na Amazônia para fazerem o que quiserem onde bem entenderem. A seção Ciência pega o gancho do assunto e fala sobre um estudo inédito, que contou com as organizações membro WWF – Brasil e Greenpeace Brasil, que alerta a respeito da contaminação por mercúrio, acima de níveis seguros, em peixes consumidos na Amazônia. É o preço que todos nós pagamos pela negligência das autoridades.  No Interior em Foco, falamos sobre uma estratégia que desenvolvida entre organizações da sociedade civis e governo para combater crimes ambientais. O evento de apresentação reuniu moradores de territórios indígenas para engajamento e discussões de ações.  A situação dos Mura, de Autazes (AM), foi o tema de uma coletiva de imprensa realizada pelo Ministério Público Federal (MPF). Na ocasião, o procurador da República, Fernando Merloto Soave, resgatou o histórico do conflito criado no território pela pressão para exploração de potássio. Lideranças expuseram as ameaças e todos os problemas que a situação acarreta. A nossa matéria traz informações sobre o assunto, além do link para a coletiva de imprensa completa e documentos disponibilizados pelo órgão.   Como sempre, não deixe de ler a seção Monitoramentos, com informações consolidadas de focos de calor e desmatamento, além do Minuto BR, que, destacamos, traz as últimas informações sobre a investigação da chacina do rio Abacaxis.Boa leitura!

Em Tapauá, indígenas Apurinã da Aldeia Trevo realizam primeira venda de óleo de copaíba do território para a Aspacs 

Indígenas Apurinã da Aldeia Trevo, na Floresta Estadual (FES) Tapauá, vivem um momento histórico: o início da comercialização do óleo de copaíba extraído no seu território para a Associação dos Produtores Agroextrativistas Colônia do Sardinha (Aspacs). O diferencial dessa transação comercial a negociação com preço justo. Isso só foi possível devido ao engajamento da Associação da União das Comunidades Indígenas do Trevo de Tapauá (Aucitt) para o aprimoramento de técnicas tradicionais de extração do óleo, usadas há gerações, com boas práticas que garantam a qualidade e a inserção do produto no mercado. A iniciativa é importante para locais como Tapauá, onde o desmatamento aumenta ano após ano, destruindo a biodiversidade e comprometendo a qualidade vida de quem depende da floresta em pé para viver.  Tudo começou em 2022, quando 17 indígenas da Aldeia Trevo, sendo cinco mulheres e 12 homens, participaram do curso Boas Práticas de Manejo de Copaíba promovido pela Iniciativa de Governança Territorial, do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam). Eles aprenderam técnicas de extração de óleo de copaíba adequadas ao padrão de qualidade do mercado consumidor em atividades que intercalaram teoria, exercícios práticos, demonstração de uso de equipamentos e até medidas de segurança do trabalho.  “Os indígenas já sabiam do potencial de produção do território, mas não dominavam técnicas de manejo que assegurassem a qualidade da extração do óleo e nem a sustentabilidade da produção. Três meses após o curso, que foi realizado em outubro do ano passado, já recebemos a primeira remessa dentro do padrão adequado”, contou o secretário da Aspacs e membro da Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (Focimp), Rogério Apurinã. Ele apresentou os parâmetros de qualidade da Aspacs para a extração do óleo e garantiu a compra da primeira produção da Aucitt. “Nesse curso, a participação da Aspacs, foi na parte comercial, de garantia de compra e de um mercado mais justo”, descreveu Rogério. “A importância desse contato com os extrativistas é para valorizar e fortalecer o trabalho comunitário, que não vai degradar o meio ambiente e nem causar prejuízos. E é uma garantia de trabalho até para gerações futuras com uma economia de base fortalecida, inclusiva e sustentável, por meio da promoção das cadeias de valor indígenas”, avaliou.  Capacitação foi realizada pelo Idesam em novembro de 2022 na FES Tapauá. Foto: Jonas Gonçalves/Idesam A ocasião contou, ainda, com um intercâmbio de experiências com a Iniciativa Estratégica Produção Sustentável, também do Idesam, para que os comunitários aprendessem a usar o aplicativo Cidades Florestais, que faz um diário de campo e ajuda na gestão das atividades produtivas. “Adotar as boas práticas de manejo, que contribuem tanto para a conservação das áreas de ocorrência da copaíba quanto para a melhoria da produção das copaibeiras, é uma das melhores práticas sustentáveis”, destacou Flávia Araújo, técnica florestal do Idesam que ministrou o curso de boas práticas. “Por isso, é muito importante seguir as orientações e as recomendações de conservação das áreas de ocorrência e monitoramento da produção de óleo-resina de copaíba”, completou Flávia.  A ideia do Idesam é levar este curso para outras comunidades e aldeias, enquanto o projeto estiver em vigência, à medida que os moradores manifestem interesse. “O curso foi realizado nessa aldeia, primeiramente, devido ao grande interesse e mobilização dos indígenas para que a atividade de fato acontecesse. Além disso, faz todo sentido implementarmos projetos deste tipo em territórios onde os moradores já têm a cultura da extração da copaíba, que é uma atividade muito trabalhosa”, explicou Paula Guarido, coordenadora do projeto Governança Socioambiental Tapauá. “Em muitos casos, os copaibais estão a longas distâncias das comunidades e a atividade exige um grande esforço físico dos coletores”, completou. “Um dos grandes objetivos da primeira fase do projeto foi fechar o ciclo dessa cadeia produtiva, desde a coleta até a comercialização com valor agregado em um produto de qualidade. Conseguimos apoiar a primeira venda para a Aspacs, o que ainda é pouco, mas é um começo importante. Ficamos muito felizes e motivados com esse resultado”, acrescentou Guarido.  A Aldeia Trevo é um dos territórios indígenas do povo Apurinã (Pupỹkary) localizados dentro da FES Tapauá, na margem direita do rio Ipixuna, onde vivem 27 famílias. Entre as atividades praticadas pelos Apurinã da Trevo estão a agricultura familiar, a caça, a pesca e o extrativismo.  Garantia de compra   Tantico, como é conhecido o agente de saúde Francisco Filho Braga de Souza Apurinã, foi um dos participantes do curso. Para ele, o melhor aprendizado foi saber que existem alternativas ao atravessador. “Aprendi como extrair o óleo de maneira adequada, como eu não sabia, assim como outros comunitários que também desconheciam a técnica. Além disso, este curso nos ajudou a tirar a figura do atravessador do processo de venda da copaíba”, contou Tantico. “O que aprendi vai me ajudar a buscar melhorias e um preço melhor pela nossa produção”, acrescentou. Ele também disse que acredita que a copaíba tem potencial para incrementar as finanças das famílias da aldeia. “A maioria dos moradores da comunidade tira copaíba, mas por época. Tem um período do inverno onde é mais fácil fazer a coleta, mas também temos a castanha, o açaí, a nossa roça com banana, cará, de tudo nós plantamos”, disse.  A mesma opinião otimista é compartilhada pelo cacique da Aldeia Trevo, Francisco de Assis Pereira da Silva Apurinã. “Fizemos um bom trabalho durante este curso. Foi uma boa oportunidade recebermos o Idesam. Agora, vamos seguir o que aprendemos e vamos trabalhar nesse projeto pela melhoria da vida da aldeia”, avaliou o cacique.  Todos ganham  Embora o extrativismo seja uma prática tradicional, ele exige cuidado quando a intenção é comercializar o produto. “No caso da copaíba, a árvore tem que ter um tronco a partir de determinada espessura, o óleo deve ser colocado em recipientes limpos”, destacou Rogério. “Além disso, essa atividade permite que os indígenas fortaleçam a vigilância territorial, porque eles precisam andar por todo o território e, ainda, gera renda”, acrescentou Rogério Apurinã.  Rogério diz que o mercado da copaíba no Amazonas, hoje, é praticamente restrito a territórios indígenas, porque a exploração intensa e desenfreada prejudicou a continuidade da atividade em outras áreas. “Ainda assim, o preço é bastante baixo, o que faz com que os extrativistas não invistam na copaíba, pois preferem a castanha ou pesca. Mas a Aspacs garante o pagamento de um preço justo aos produtores. E a FES Tapauá, assim como o restante de Tapauá, tem bastante potencial para a copaíba, por ainda ser um município bastante conservado e de difícil acesso”, garantiu o secretário da Aspacs. “É muito importante pra Aspacs chegar aos Apurinã de Tapauá, queremos torná-los referência, porque assim a gente mostra que é possível praticar um preço justo e gerar um retorno para as comunidades e avançar em outras cadeias”, finalizou.  A copaíba  A copaíba é um dos remédios mais populares da medicina da floresta. Quem vive na Amazônia, desde criança, trata inflamações, machucados e até parasitas com seu óleo e o chá de suas folhas, que veem da suntuosa árvore que mede, em média, 30 metros de altura e vive até 400 anos. O óleo é extraído por uma perfuração feita no caule que, instantaneamente, perfuma o ambiente. Seguidas as boas práticas de manejo, a atividade é considerada sustentável, pois não há necessidade de derrubar a árvore, que logo se regenera e continua a produzir o óleo. Há gerações, esta prática é fonte de saúde e renda para os povos da floresta.  Óleo de copaíba sendo extraído da árvore. Foto: Inatú Amazônia A coordenadora do projeto Governança Socioambiental Tapauá, Paula Guarido, explica que é necessário o aprimoramento técnico do manejo da copaíba para que as árvores continuem saudáveis e produzindo por muitos anos. “Hoje, muitos extrativistas não utilizam as boas práticas por falta de acesso a esse conhecimento, e isso pode comprometer a produção da árvore. É importante que as comunidades saibam mapear os copaibais, identificar as árvores que possuem o óleo, limpar e prepará-las para que só então sejam perfuradas”, disse Guarido. “Hoje, utilizamos recursos como os tubos de PVC, que garantem uma boa vedação do ponto perfurado e uma nova extração do óleo após alguns anos, sem a necessidade de nova perfuração”, destacou.  O projeto Governança Socioambiental Tapauá é financiado pela Rainforest Association e tem como prioridade, a realização de projetos em Áreas Protegidas de Tapauá, como a FES Tapauá, uma Unidade de Conservação estadual. O curso Boas Práticas de Manejo de Copaíba contou com a parceria da Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Amazonas (Sema-AM) para avaliação e aprovação da execução do projeto no local por meio do Acordo de Cooperação Técnica N.º 003/2023. Com o intuito de apoiar os extrativistas nas atividades, o Idesam doou à Aucitt materiais didáticos e técnicos e mais cinco quites com materiais e equipamentos para extração adequada e segura do óleo, e para o mapeamento dos copaibais. A equipe do projeto segue fornecendo apoio técnico aos participantes do curso e retornará à Aldeia Trevo para avaliar, de forma participativa, o andamento das atividades e para planejar as próximas ações voltadas ao fortalecimento da cadeia de valor da copaíba na região. 

Ciência inclusiva na rodovia: a biodiversidade da BR-319 na língua indígena Tupi-Kagwahiva 

Sergio Santorelli Junior¹  Um dos grandes desafios do cientista brasileiro é tornar público os seus resultados. Na maioria das vezes, eles são publicados em revistas de língua estrangeira, geralmente em inglês que é considerada a língua universal da ciência acadêmica, o que limita o acesso às informações para uma parte da população. No Brasil, essa situação é um pouco mais crítica, pois vivemos em um dos países com a maior diversidade de línguas do mundo!   Além do português, existe uma variedade enorme de línguas indígenas faladas em todo o território nacional. No Sudoeste do Amazonas, uma das mais populares pertence ao tronco linguístico Tupi-Kagwahiva. Além disso, uma grande parte das florestas preservadas estão em territórios indígenas, e levar o conhecimento das universidades e institutos de pesquisa para os territórios é fundamental para ações que buscam conservar a biodiversidade amazônica.   Através das iniciativas do Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração no Sudoeste do Amazonas (PSAM), da Universidade Federal do Amazonas – Campus Vale do Rio Madeira, de vários pesquisadores, estudantes de pós-graduação e da comunidade indígena, foram publicados na língua Tupi-Kagwahiva, três livros que apresentam a diversidade de sapos, cobras venenosas e peixes que estão presentes em florestas na área de influência da BR-319.   No livro Kurua Humaitá Kavyra Porá, é possível conhecer a enorme variedade de formas, cores e hábitos dos sapos da região de Humaitá e o curioso caso da espécie popularmente chamada de sapo-pipa. Já no livro Moia Humaitá Kavyra Porá, é feita uma introdução sobre as cobras venenosas mais comuns na localidade. Por fim, no livro Pira Yae Rekwarupiva'ea é demonstrada a diversidade de peixes que vivem nos igarapés e várias curiosidades, como a da espécie conhecida como peixe-borboleta. É sempre bom lembrar: estas publicações são conteúdos de divulgação científica e popularização do conhecimento produzido por cientistas junto à comunidade local, elas não devem ser usadas como qualquer tipo de orientação para justificar o contato com os animais sobre os quais falam. Isso quer dizer que: evitar o contato é sempre a melhor atitude para prevenir acidentes e evitar problemas, uma vez que animais silvestres não são, e não devem ser, animais domésticos.   Através dessas obras, esperamos compartilhar com os povos originários da Amazônia o conhecimento acumulado através de anos de pesquisas científicas. É provável que tenhamos mais conhecimento a receber do que a entregar, e transpondo a barreira da comunicação que existe entre os cientistas e os guardiões originários da floresta, podemos encontrar soluções mais efetivas para a conservação da mais exuberante floresta do planeta. O primeiro passo foi dado!  ¹Biólogo e pesquisador vinculado à Universidade Federal do Amazonas – Campus Vale do Rio Madeira na cidade de Humaitá,  através do Programa de fixação de Recursos Humanos no Interior do Estado (FAPEAM – PROFIX Edital 009/2021). 

Povos do sul do Amazonas marcam presença no ATL 2023 

Mais de seis mil indígenas das calhas dos rios Madeira e Purus participaram do 19º Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília (DF). Entre os povos estão os Tenharim, Parintintin, Jamamadi, Apurinã, Dijahui e Juma, e as organizações Apij, Opiam, Opiapam, Opiajbam, Focimp, Opiaj, Apitipre e Apitem e, claro, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Com o tema O futuro indígena é hoje. Sem demarcação não há democracia!, a programação do evento contou mais de 30 atividades, divididas em cinco eixos temáticos: Diga o povo que avance, Aldear a Política, Demarcação Já, Emergência Indígena e Avançaremos. Os eixos contam com plenárias sobre mulheres indígenas, parentes LGBTQIA+, gestão territorial e ambiental de Terras Indígenas, acesso a políticas públicas e povos indígenas em isolamento voluntário.  O cacique Adamor Mura foi uma das lideranças ouvidas durante as plenárias e falou sobre as invasões que a Terra Indígena Lago Capanã, em Manicoré, tem enfrentado. Segundo ele, os moradores do local já têm dificuldades para acessar os castanhais do território. “Os castanhais do local onde eu moro, estão se transformando em campos de soja e de gado”, relatou. “Hoje, o povo não consegue chegar ao castanhal dele, porque o madeireiro tá lá! Já fizeram três ramais subindo da BR-319, em direção ao [rio] Madeira. Eles soterraram a cabeceira de um rio e isso está causando uma grande seca [no território]”, disse acrescentando que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) já foi alertado sobre a situação, mas ainda não deu resposta.  Até o fechamento desta edição, havia a expectativa de que o presidente Lula (PT) assinasse a homologação de 14 Terras Indígenas (TIs) com processo de criação avançado, na lista constam duas do Amazonas: TI Uneixi, do povo Makoto Tukano; e a TI Acapuri de Cima, do povo Kokama. Durante a programação, de 24 a 28 de abril, aconteceram várias marchas e manifestações pela demarcação de terras. Os povos indígenas também decretaram estado de emergência climática. Além da Coiab, outras organizações membro do OBR-319 participaram do ATL, como IEB, WWF Brasil, Greenpeace Brasil, Opan, WCS e CNS.  Sobre o ATL  O ATL é a maior assembleia dos povos e organizações indígenas do Brasil e acontece desde 2004. A mobilização surgiu a partir de uma ocupação realizada por povos indígenas do sul do país, na frente do Ministério da Justiça, na Esplanada dos Ministérios, que recebeu adesão de lideranças e organizações indígenas de outras regiões do país, principalmente das áreas de abrangência da Coiab e da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste e Minas Gerais (APOINME).  Este texto foi produzido em colaboração com a jornalista Trícia Oliveira, do WWF – Brasil, e com informações do IEB e da Coiab. 

Informativo nº42 Abril/2023

Baixar Este é o Abril Indígena mais importante dos últimos tempos! Pela primeira vez na história do Brasil, os povos originários puderam comemorar, oficialmente, o 19 de abril como o Dia dos Povos Originários. Um passo importante para a decolonização da data e fortalecimento das suas lutas. O Amazonas está em peso entre os cerca de 6 mil indígenas, de diversos povos, que tomaram Brasília (DF) em mobilização por pautas pela demarcação e democracia, duas coisas que deveriam ser sinônimas no Brasil. Esta edição traz imagens e informações sobre o evento, que é o assunto da seção Diálogos da BR-319, especialmente “reativada” para isso. Não poderíamos deixar passar.  O Destaque do Mês é uma notícia que nos dá grande satisfação em anunciar: o início da comercialização de óleo de copaíba produzido em território Apurinã de Tapauá por um preço justo. A nossa felicidade é porque isso só foi possível a partir de um curso de boas práticas ministrado pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Conservação da Amazônia (Idesam) através do projeto Governança Socioambiental Tapauá. Os indígenas aprenderam técnicas de manejo adequadas, que prolongam a produção da resina pelas árvores e, ainda, são apropriadas para o padrão de qualidade exigido pelo mercado consumidor. O que torna a notícia ainda mais especial é que a Floresta Estadual (FES) Tapauá é uma das Unidades de Conservação (UC) mais desmatadas da área de influência da BR-319, com fortalecimento do extrativismo na UC, a floresta em pé ganha importância para a manutenção do bem-estar de quem depende dela.  O Interior em Foco também fala sobre outra cadeia da sociobiodiversidade importante para a área de influência da rodovia: a da castanha-da-amazônia. Um estudo realizado pelo Observatório da Castanha-da-Amazônia (OCA) mostra a importância da valorização de todas as etapas desta cadeia e quando ela rende mais. É importante não perder de vista este tipo de informação, uma vez que a castanha é um dos produtos com maior potencial da bioeconomia na Amazônia.  A seção Ciência, traz, novamente, um artigo sobre a divulgação científica em língua indígena. Desta vez, o texto fala sobre três livros a respeito de cobras e sapos na região de Humaitá. Está imperdível! Por fim, não deixe de conferir os monitoramentos de desmatamento e focos de calor, além do Minuto BR.  Boa leitura! 

Castanha-da-amazônia e os desafios da cadeia de valor 

A castanha-da-amazônia é coletada quase que exclusivamente por povos indígenas e comunidades tradicionais da Amazônia, tornando a castanheira e seus frutos centrais na conservação da maior floresta tropical do mundo e na manutenção dos modos de vida das populações que a produzem. Mesmo movimentando mais de R$ 2 bilhões por ano, o valor ‘invisível’ que a cadeia de valor da castanha-da-amazônia carrega não é considerado na remuneração dos castanheiros e castanheiras. É o que aponta o estudo “A Castanha-da-Amazônia: Aspectos Econômicos e Mercadológicos da Cadeia de Valor”, publicado pelo Observatório Castanha-da-Amazônia (OCA).   “O estudo buscou estimular o diálogo sobre questões que são fundamentais para a cadeia, como a valorização dela e das economias de base florestal, dos produtos e dos produtores extrativistas da Amazônia, mas especialmente as melhores formas para repartir os benefícios socioeconômicos dos envolvidos”, explica Renata Toledo, coordenadora da pesquisa que gerou o estudo.  Considerando os principais elos e as etapas de comercialização, o estudo estima a movimentação anual mais de R$ 2,3 bilhões, principalmente no atacado e no varejo, que respondem por R$ 1,9 bilhão, 84% do total, seguidos das usinas processadoras, que movimentam R$ 278 milhões, representando 12% do total do valor.   Por fim, as organizações comunitárias, povos indígenas e comunidades tradicionais que vendem a castanha in natura movimentam R$ 99 milhões, representando apenas 4% do total movimentado na cadeia. “Os indígenas conservam a natureza. E isso não é valorizado pela maioria, como deveria ser. Estamos conservando a nossa terra com nossos conhecimentos, nossa força, e nossa luta”, opina Maria dos Anjos, liderança da aldeia Novo Paraíso, da Terra Indígena (TI) Caititu, do povo Apurinã.   “Esse trabalho tem uma enorme importância para a gestão dos territórios. Temos que entender que esses territórios estão com a floresta em pé por causa do trabalho de ocupação territorial dos castanheiros e castanheiras”, explicou Diogo Henrique Giroto, coordenador do Programa Amazonas da Operação Amazônia Nativa (OPAN).   Apesar dos inúmeros atributos socioambientais que a castanha carrega, eles estão longe de ter um peso significativo na decisão de compra por parte do setor industrial e comercial, já que o preço é o principal fator para tomadas de decisão sobre compras nos elos finais da cadeia de valor. A depender da volatilidade de preços na safra da castanha, ela é substituível por outras nozes e castanhas que muitas vezes são plantadas em monoculturas e não possuem o mesmo valor socioambiental e cultural que a castanha-da-amazônia tem.   “Mudar o cenário não é fácil, mas ele não pode ser deixado para depois. A gente precisa melhorar a infraestrutura produtiva, comercial, logística, fazer o fomento adequado da produção, da gestão e da comercialização da castanha e, especialmente, dar o devido valor aos atributos socioculturais e socioambientais da castanha”, finaliza Renata.  Este texto foi adaptado da versão original publicada no site do coletivo Raízes do Purus, uma iniciativa da Operação Amazônia Nativa (Opan), organização membro do OBR-319. 

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