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Acesso limitado ou inexistente à internet pode inviabilizar a participação de comunidades tradicionais e povos indígenas em audiência pública virtual para licenciamento da BR-319

Há cerca de um mês, o líder indígena Waldimiro Farias da Silva Apurinã participou de sua primeira live para falar sobre a luta que trava pelos direitos de seu povo. Conseguiu, porque reside com a família em Tapauá, um dos municípios da BR-319, onde exerce a função de coordenador executivo da Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (FOCIMP).

Publicado em: 27/05/2021

Crédito: Divulgação / Idesam

Sem intimidade com as novas tecnologias, pediu ajuda a um amigo da FUNAI para acessar a plataforma do encontro, mas garantiu que sem o auxílio, certamente, perderia a oportunidade. “Nas aldeias, não temos acesso à internet. Ela ainda é totalmente desconhecida para muitos dos nossos parentes”, afirmou o líder. 

Atento ao processo de licenciamento ambiental da BR-319, Waldimiro já conhecia o Edital 01, do IBAMA, publicado no dia 21 de setembro de 2020, informando a abertura do prazo de 45 dias para solicitação de audiência pública, a partir da publicação, conforme determina a Resolução CONAMA 009/1987. Entretanto, não lhe agrada a possibilidade dela ser virtual, como autoriza a Resolução CONAMA 494/2020, publicada em 12 de agosto de 2020, enquanto perdurar a situação de calamidade pública decorrente da pandemia do Covid-19. “Isso não vai dar certo. Só eu que uso internet, porque estou na cidade. Outras lideranças têm que participar também para apresentarem ao governo e ao DNIT os problemas que já estão sendo sentidos com as obras na estrada”, ressaltou o indígena.

Da mesma opinião de Waldimiro, compartilha Sílvia Elena Moreira Batista, diretora de Direitos Humanos do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS). Ela acredita que a audiência pública pode ser a última chance para que povos indígenas e populações tradicionais afetados direta ou indiretamente com as obras da BR-319 se manifestem sobre seus reais anseios e apresentem ao governo e empreendedor os impactos que, mesmo antes da pavimentação da rodovia, se alastram pelo território. “É de suma importância que os comunitários sejam ouvidos. Espero que a opinião dos nossos extrativistas seja levada em consideração”, disse Sílvia.

Ela ressaltou também que a facilidade de acesso pela BR-319 tem contribuído para o aumento de invasores e de atividades ilícitas na região. “Sabemos que a pavimentação da rodovia poderá contribuir para o escoamento da produção local, mas se os impactos da obra não forem controlados, nós vamos perder ainda muito mais”, lamentou.

A advogada e coordenadora do Programa Xingu, do Instituto Sociambiental (ISA), Biviany Rojas Garzón avalia que a alternativa de realização de consultas públicas virtuais atende a uma pressa que vem apenas do governo. “Esse mecanismo de comunicação está longe de respeitar os procedimentos estabelecidos em protocolos de consulta, nos quais um dos elementos comuns está relacionado à presença dos representantes dos governos em Terras Indígenas”, garantiu Biviany.

Solicitação de Audiência

A solicitação de audiência pública, etapa importante do processo de licenciamento ambiental da BR-319, poderá ser feita ao IBAMA por entidade civil, pelo Ministério Público ou por 50 ou mais cidadãos, até o dia 5 de novembro: prazo de 45 dias contados a partir da publicação do Edital 01/2020, do IBAMA, no dia 21 de setembro de 2020. Ela poderá ser protocolada em qualquer unidade do IBAMA listadas no site do instituto: 

https://www.ibama.gov.br/institucional.

O Edital também informa que o EIA e o RIMA do empreendimento ‘BR-319 Trecho Porto Velho-Manaus: restauração e melhorias’ foram disponibilizados para consultas em: https://bit.ly/2GgQN56 e nas Prefeituras e Câmaras Municipais de Beruri, Borba, Humaitá, Manaus, Manicoré, Tapauá, Canutama e Porto Velho; nas Prefeituras Municipais de Careiro da Várzea, Careiro Castanho, Manaquiri e Iranduba; Procuradoria da República no Estado do Amazonas; Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental do Estado de Rondônia; Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Amazonas; Superintendência do Ibama no Amazonas; Centro Nacional de Monitoramento e Informações Ambientais do IBAMA (CENIMA), Brasília/DF; Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), em Brasília/DF.

No Edital não constam os municípios de Autazes e Lábrea.

Conforme a Resolução CONAMA 009/1987, “em função da localização geográfica dos solicitantes, e da complexidade do tema, poderá haver mais de uma audiência pública sobre o mesmo projeto de respectivo RIMA”.

Ponto de acesso virtual

A Resolução CONAMA 494/2020 estabelece, em caráter excepcional e temporário, nos casos de licenciamento ambiental, a possibilidade de realização de audiência pública de forma remota, por meio da internet, durante o período da pandemia do Covid-19.

O IBAMA definirá os procedimentos técnicos relativos à audiência pública virtual, observando os seguintes passos:

  • Ampla divulgação e disponibilização do conteúdo do produto em análise e do seu referido RIMA;
  • Viabilização, observada a segurança sanitária dos participantes, de ao menos um ponto de acesso virtual aos diretamente impactos pelo empreendimento e, caso se faça necessário, de outros pontos, conforme análise do caso pela autoridade licenciadora;
  • Discussão do RIMA;
  • Esclarecimento das dúvidas;
  • Recebimento das críticas e sugestões dos participantes.

Audiência e participação públicas virtuais devem seguir procedimentos determinados pelo Ibama

Fonte: Cescon Barrieu Insights

Em atenção à Resolução Conama nº 494/2020, a Diretoria de Licenciamento Ambiental do IBAMA editou o Procedimento Operacional Padrão nº 6/2020, definindo os conceitos de participação pública virtual e de audiência pública virtual. É assegurado o acompanhamento das apresentações do RIMA e do projeto e o recebimento de documentos por diferentes plataformas de mensagens.

Os interessados poderão formular críticas, sugestões e perguntas através dos canais digitais disponíveis durante a audiência ou por e-mail institucional específico criado para o evento pelo prazo de até 20 dias após a realização da audiência. O empreendedor terá prazo de 48 horas para repassar ao IBAMA as contribuições e questionamentos registrados em suas plataformas digitais. Caso algum questionamento não possa ser respondido durante a transmissão da audiência, o IBAMA deverá encaminhar uma resposta em até 20 dias.

Participação Limitada

Audiências remotas limitam participação indígena no processo de licenciamento. Por Josie Jeronimo / OPAN. Veja aqui.

Edição 12 – Setembro 2020 – Destaques

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