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Ciência inclusiva na rodovia: a biodiversidade da BR-319 na língua indígena Tupi-Kagwahiva 

Publicado em: 28/04/2023

A jararaca é uma das espécies encontradas na região. Foto: Guia de Cobras e Sapos

Sergio Santorelli Junior¹ 

Um dos grandes desafios do cientista brasileiro é tornar público os seus resultados. Na maioria das vezes, eles são publicados em revistas de língua estrangeira, geralmente em inglês que é considerada a língua universal da ciência acadêmica, o que limita o acesso às informações para uma parte da população. No Brasil, essa situação é um pouco mais crítica, pois vivemos em um dos países com a maior diversidade de línguas do mundo!  

Além do português, existe uma variedade enorme de línguas indígenas faladas em todo o território nacional. No Sudoeste do Amazonas, uma das mais populares pertence ao tronco linguístico Tupi-Kagwahiva. Além disso, uma grande parte das florestas preservadas estão em territórios indígenas, e levar o conhecimento das universidades e institutos de pesquisa para os territórios é fundamental para ações que buscam conservar a biodiversidade amazônica.  

Através das iniciativas do Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração no Sudoeste do Amazonas (PSAM), da Universidade Federal do Amazonas – Campus Vale do Rio Madeira, de vários pesquisadores, estudantes de pós-graduação e da comunidade indígena, foram publicados na língua Tupi-Kagwahiva, três livros que apresentam a diversidade de sapos, cobras venenosas e peixes que estão presentes em florestas na área de influência da BR-319.  

No livro Kurua Humaitá Kavyra Porá, é possível conhecer a enorme variedade de formas, cores e hábitos dos sapos da região de Humaitá e o curioso caso da espécie popularmente chamada de sapo-pipa. Já no livro Moia Humaitá Kavyra Porá, é feita uma introdução sobre as cobras venenosas mais comuns na localidade. Por fim, no livro Pira Yae Rekwarupiva’ea é demonstrada a diversidade de peixes que vivem nos igarapés e várias curiosidades, como a da espécie conhecida como peixe-borboleta. É sempre bom lembrar: estas publicações são conteúdos de divulgação científica e popularização do conhecimento produzido por cientistas junto à comunidade local, elas não devem ser usadas como qualquer tipo de orientação para justificar o contato com os animais sobre os quais falam. Isso quer dizer que: evitar o contato é sempre a melhor atitude para prevenir acidentes e evitar problemas, uma vez que animais silvestres não são, e não devem ser, animais domésticos.  

Através dessas obras, esperamos compartilhar com os povos originários da Amazônia o conhecimento acumulado através de anos de pesquisas científicas. É provável que tenhamos mais conhecimento a receber do que a entregar, e transpondo a barreira da comunicação que existe entre os cientistas e os guardiões originários da floresta, podemos encontrar soluções mais efetivas para a conservação da mais exuberante floresta do planeta. O primeiro passo foi dado! 

¹Biólogo e pesquisador vinculado à Universidade Federal do Amazonas – Campus Vale do Rio Madeira na cidade de Humaitá,  através do Programa de fixação de Recursos Humanos no Interior do Estado (FAPEAM – PROFIX Edital 009/2021). 

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